A blockchain de US$ 88 bilhões que nasceu em um café de São Francisco
Edição #984 - Dia 23 de agosto de 2025
No domingo, 17 de agosto, o validador "Cavey Cool" fez algo que ninguém achava possível: processou 107,5 mil transações por segundo em um único bloco na rede Solana. O bloco #360650523 registrou 43 mil transações bem-sucedidas, estabelecendo o primeiro registro de uma blockchain processando mais de 100 mil tps no mainnet.
Para contextualizar: isso é mais rápido que a Visa, que processa até 65 mil transações por segundo. Bitcoin faz 7. Ethereum cerca de 30. É como comparar um foguete da SpaceX com uma carroça puxada por bois. E o mais impressionante? O teste foi feito "por capricho" ("on a whim"), como disse o próprio desenvolvedor Cavey, apenas para ver até onde a rede aguentava.
Claro, antes que você venda a sua casa para comprar o token SOL, uma ressalva: a maioria dessas transações eram "no-op" – instruções leves que não executam computação significativa, usadas principalmente para testes de stress. Mas Mert Mumtaz, cofundador da Helius, argumenta que o custo para a rede não foi trivial, considerando verificação de assinatura e carregamento de dados. Em condições reais, Solana poderia processar 100 mil transferências de tokens por segundo ou 10-20 mil swaps usando o novo padrão p-token.
A blockchain que atingiu esse marco nasceu de uma frustração em 2017. Anatoly Yakovenko, engenheiro ucraniano que imigrou para os EUA nos anos 90, estava irritado porque a conferência do Bitcoin parou de aceitar pagamentos em Bitcoin porque as taxas tinham chegado a US$ 70 por transação. O evento mundial da principal criptomoeda não conseguia usar a própria criptomoeda. Era o equivalente digital de um congresso de cardiologistas servindo bacon no coffee break.
Yakovenko foi ao Café Soleil em São Francisco, pediu dois cafés e uma cerveja, e ficou até 4 da manhã pensando em uma solução. Entre o segundo expresso e os últimos goles de cerveja, teve sua epifania: descobriu como codificar a passagem do tempo como uma estrutura de dados. Chamou isso de Proof of History: um relógio criptográfico que elimina a necessidade de computadores discutirem sobre ordem de eventos.
Memecoins presidenciais e ETFs institucionais na mesma rede
Hoje, a rede que nasceu dessa noite insone processa volumes surreais. Em janeiro, quando Donald Trump lançou seu memecoin oficial ($TRUMP) na Solana, a blockchain processou US$ 30 bilhões em volume em um único fim de semana. A plataforma Pump.fun, que permite criar memecoins por apenas 0.02 sol (cerca de US$ 2,60), já lançou 11 milhões de tokens e gerou US$ 700 milhões em receita desde 2024.
O ecossistema de memecoins em Solana atingiu uma capitalização de mercado de US$ 11,5 bilhões, tornando-se o epicentro da especulação cripto. Mas aqui está a ironia: enquanto processa memecoins de celebridades e tokens com nomes impronunciáveis, Solana simultaneamente atrai gigantes financeiros tradicionais.
Seis pesos-pesados (Grayscale, VanEck, Fidelity, Franklin Templeton, Bitwise e 21Shares) aguardam aprovação da SEC para lançar ETFs de Solana. Apostadores no Polymarket dão 89% de chance de aprovação até outubro de 2025. Analistas da Bloomberg elevaram as probabilidades para 95%, prevendo uma onda de novos produtos cripto no segundo semestre.
Franklin Templeton, Société Générale e Visa já adotaram a Solana para pagamentos institucionais. A Visa usa a rede para enviar usdc diretamente para comerciantes, contornando o sistema bancário tradicional. Quatro empresas públicas mantêm US$ 591 milhões em tokens sol em suas tesourarias corporativas.
Os números impressionam: 67,12% do supply está em staking com 1.321 validadores ativos. A rede gera US$ 260 milhões em taxas cobrando apenas US$ 0,02 por transação. É o Atacadão das blockchains: margem baixa, volume imenso, foco absoluto em escala.
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O preço da velocidade e a arte de cair em pé
Entre setembro de 2021 e outubro de 2022, Solana caiu oito vezes, incluindo uma parada de 17 horas que gerou pânico generalizado. Os críticos apontavam: velocidade demais, descentralização de menos. A equipe respondeu com melhorias sistemáticas: protocolo QUIC, deduplicação aprimorada, correções de bugs. É trocar o motor do avião durante o voo, mas aparentemente funciona.
O teste definitivo veio em novembro de 2022 com o colapso da FTX. Sam Bankman-Fried era o maior apoiador de Solana. Quando seu império desmoronou, o preço do sol despencou 40% em um dia. Todo mundo assumiu que a blockchain estava condenada.
A comunidade não esperou milagres. Desenvolvedores rapidamente criaram o OpenBook, um fork independente da plataforma Serum que a FTX controlava. Enquanto investidores entravam em pânico, a blockchain continuou processando transações sem parar. Zero downtime durante a crise. A tecnologia havia transcendido seus patronos.
A recuperação foi impressionante. Em janeiro de 2025, sol atingiu US$ 294, novo recorde histórico, ironicamente impulsionado pelos memecoins de Trump. O TVL ultrapassou US$ 10 bilhões pela primeira vez desde a FTX. A capitalização de mercado alcançou US$ 88,1 bilhões.
Yakovenko, agora com 44 anos e patrimônio estimado entre US$ 400 e US$ 500 milhões, mantém uma filosofia gerencial peculiar: código de manhã, surf à tarde, decisões importantes pedalando. Curiosamente, ele se opôs publicamente à inclusão de Solana na reserva cripto do governo Trump: "Se você quer que a descentralização falhe, coloque o governo no comando".
Sobre a competição com a Ethereum – o que a indústria chama de "blockchain wars" – Yakovenko rejeita o tribalismo. Diferentes blockchains podem coexistir, insiste. Visão surpreendentemente madura para uma indústria onde pessoas rotineiramente preveem o apocalipse de protocolos concorrentes.
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O desenvolvedor Cavey acredita que melhorias significativas chegarão em "três meses na melhor das hipóteses, seis meses na pior". Se concretizadas, Solana poderia processar os mercados financeiros mundiais inteiros on-chain. "Alta capacidade permite que todos os mercados do mundo estejam on-chain", disse Cavey. "Sem essa capacidade, só podemos esperar suportar alguns poucos".
A blockchain que nasceu porque o Bitcoin não conseguia processar seus próprios pagamentos agora processa mais transações em uma hora do que o Bitcoin em um mês. E faz isso sustentando simultaneamente memecoins presidenciais, NFTs de celebridades e o futuro das finanças institucionais, tudo por centavos de dólar.
Se os ETFs forem aprovados em outubro, Solana oficialmente transcenderá comparações. Não será mais a "Ethereum killer" ou a "blockchain rápida". Será simplesmente Solana, uma infraestrutura financeira global que calhou de ser construída por um ucraniano que resolve problemas pedalando de bicicleta.
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